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Mula - Capítulo 04.




Ele foi, pensou Elisabete, com animação . Estava ali, conversando com Matias que, depois de comer metade dos lanches preparados por Rogéria, quase dormia encostado em uma árvore. O padre não usava a batina, só uma bermuda preta e uma camiseta verde-musgo que, aos olhos da visitante, ficava perfeita nele.

A mulher molhou os braços que começavam a secar. Durante o ato, olhava ao redor, tentando encontrar uma forma de serem vistos. O rio, naquele ponto, era fino e ordenado por um barranco repleto de raízes grossas e perfeitas para segurarem os sedimentos da natureza. As árvores impedia que um ser humano leigo chegasse ao lugar com facilidade e tornava o lugar um ponto perfeito para que algo ruim acontecesse.


O lugar perfeito para que a visitante desse seu bote.

- A viagem começou a valer a pena?

Elisabete ergueu os olhos e sorriu para o padre. Ele sentava ao seu lado, mergulhando as pernas na água e fazendo uma careta estranha ao sentir a água refrescante. Ainda tinha sol e ele queimava exatamente aquele ponto. E queimaria até o último raiozinho.

- A água é fresca, mas meu ar-condicionado me taria o mesmo prazer.

Ele soltou um riso gostoso. Um riso que fez o corpo de Elisabete refrescar-se e relaxar de qualquer tensão que tivesse carregado até ali. Um riso que fazia a viagem valer cada segundo.

- Acho que está errada. - Ele estralou as costas soltando um gemido. - Você pode ter o ar-condicionado, mas a água é fresca, faz bem para a saúde e para a pele, e se você der um mergulho, sentirá que todos os problemas sumiram de seu mundo.

- Está me convidando para um mergulho? - Ela alfinetou.

Como resistir a uma resposta como a dele? O homem – pois naquele momento ele só podia ter deixado de ser um padre para ter se tornado um homem comum – arrancou a camiseta já molhada, jogou-a em algum canto seco e puxou a mulher pela mão.

- Por que não?

Quantos motivos ela tinha para explicar o porque não? Mas estava interessada nele e, definitivamente, não largaria a oportunidade. A agarraria sem parar para respirar e quando ele ameaçasse desistir, ela reacenderia o interesse. Não. Ela não negou. E quando levantou o corpo da água, o homem a sua frente pôde contemplar o biquíni recatado e ao mesmo tempo sexy que ela usava. Na terra seca, as roupas dela estavam embrulhadas em uma sacola, esperando para irem para casa.

- Terá que me ensinar a nadar. - Ela sussurrou.

E mentiu. Céus, como amava mentir!

- Estará segura comigo. - Ele devolveu. - Mas precisa confiar.

Afundaram muito mais do que ela imaginava. A cada vez que os pés tocavam em alguma alga ou peixe, Elisabete saltava com um grito baixo de novo e susto. Não era acostumada com tanta natureza e a sensação era horripilante. Enquanto isto, seu guia ria de cada reação que ela tinha. Os olhos verdes brilhando com alegria e convidando-a para um beijo.

- Ainda te dá pé? - ele perguntou.

- Pouco.

Elisabete sentiu o cansaço escorregando em sua voz. Saltar e gritar lhe cansou mais do que deveria, mas ter o coração saltando de excitação por poder provar aquele padre, aquele homem, lhe roubava energia demais.

- Ótimo.

Foi a única coisa que escutou até sentir a perna dele se entrelaçar à perna dela. Houve um puxão e o mundo mudou de posição. A terra sumiu de sua vista e o céu ficou de frente para seus olhos, como se estivesse caminhando na direção dele.

Ela percebeu no último segundo, que precisava puxar o máximo de ar que conseguisse.

O rio gritou quando sentiu a água ser perfurada pelo corpo de Elisabete. A mulher, que fora traída pelo homem santo, sentia os olhos aderem pela água e os esfregou por puro instinto.

Quis esganar o homem que mantinha-se em pé e, conforme sentir, a sua frente. Tentou, ainda lá em baixo da água, acalmar-se e por isto soltou todo o ar que conseguiu juntar. Quando decidiu voltar para a superfície, teve o lapso de puxar a bermuda do companheiro para baixo.

Os cabelos colaram-se ao corpo e o riso masculino perdurou os tímpanos femininos. Respirou fundo, recuperando todo o fôlego perdido e afastou os fios negros que colaram em seu rosto.

- Idiota. - Sussurrou.

- Você não poderia ter passado por isto sob ar-condicionado. - Comentou o Pedro, pouco antes de mergulhar no rio.

Elisabete ainda arrumava os cabelos, quando sentiu a cintura ser agarrada pelas mãos grossas do padre e o corpo ser carregado metros à frente e ao fundo. Se reergueram juntos. Ele lhe sorrindo quase sedutoramente e arrumando o curto cabelo espesso.

A mente feminina travou. O corpo estava arrepiado e pronto para beijar aquele cara. Não sabia o que falar ou agir e a vontade de se atracar ao corpo masculino não passaria despercebido. Elisabete estava em seu limite, respirando através dos lábios e com os olhos vidrados no padre a sua frente.

Se espera que, quando alguém lhe quer, ela lhe diga. Que se há vontade de beijar, haverá um aviso prévio. Mesmo que o outro alguém declare te querer, você precisa dar um sinal antes, perguntar, sondar.
Mas para aquele padre, as coisas não deviam funcionar da mesma forma. Para aquele padre, o mundo devia seguir outras regras.

Elisabete gemeu assim que os lábios carnudos foram provados. Aquele homem tinha uma das bocas mais macias que ela já tinha provado e o corpo mais quente que já tinha sentido. A excitação dele não era protegida pela bermuda e ele muito menos queria disfarçar ela.

Quando se separaram, por um ou dois segundos, Elisabete viu que estavam afastados de Matias. Aquele mergulho era um rapto e ela excitou-se ainda mais ao ter ciência de tudo. Sorriu. E agarrou sua presa.

Beijou-o com vontade, aumentando a intensidade quando sentiu os dedos dele correndo até a laço de seu biquíni. A água fresca tornou-se gelada quando o corpo dela se aqueceu pelo desejo e um gemido escapou quando ele mordeu-lhe o pescoço. Ofegavam juntos, riam, sorriam. Uma sintonia que não deveria existir.
Então, a cabeça latejou. Uma pontada aguda que a fez soltar um gemido e quando não havia nenhuma roupa lhe cobrindo o corpo, suas pernas começaram a doer. Seu pescoço começou a queimar, como se uma linha em brasa o estivesse cerrando.

Mas o corpo masculino fincou-se ao seu e ela abriu os olhos. Captou os intensos olhos verdes e sorriu ao sentir a nova investida. Céus, aquele homem lhe mataria!


.M.


Matias abriu os olhos enquanto o sobrinho saía da água batucando na orelha esquerda, como se quisesse que algo saísse de lá de dentro. Ele parecia muito satisfeito.

- Então?

- Perfeita. - Respondeu Pedro.

- Ótimo. - O mais velho se espreguiçou ao ficar de pé. - É uma pena que a correnteza seja tão forte neste horário, não é?

O sobrinho recolheu as coisas largadas no chão, assim como seu tio fazia. Era realmente uma pena, que aquilo acontecia tão poucas vezes, que precisavam manter tamanho cuidado para satisfazer um desejo puramente carnal, que todo o processo era tão lento. As desculpas eram sempre as mesmas, a pessoa sempre era pega pela correnteza, sempre perdia a consciência quando ninguém estava olhando e sumia para onde o rio desaguava.

- Sim, meu tio. É uma pena.


.M.


“Os moradores de Ponta Porosa disseram que uma nova mula surgiu e que estão prontos para matá-la. Segundo o pontaporense Paulo, as mulas costumam aparecer a cada um ou dois anos, mas este ano é a segunda vez que acontece este caso.

Com a cidadezinha banhada pelo medo, é comum escutar frases como '‘tirar o areio ou o freio é a maneira correta de salvar a moça, mas é perigoso demais. Quem dirá furar ela com alfinete.'

‘Vamos matar’. É o que mais escutamos ao andar pela pequena cidade. ‘A morte é simples rápida e só precisamos de um punhado de tiro’. Pelo que notamos, a cidadezinha esqueceu que na lenda da mula há um culpado e que todos podem ter seus pecados perdoados.”

Fim.

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